Daniel CavalcantiCaso você goste de animação, mais especificamente de animes, é quase impossível que você não tenha ouvido pelo menos uma referência ao estúdio Mappa. Com apenas uma década de funcionamento, o estúdio já é uma das principais referências atuais na produção de animações japonesas de altíssima qualidade, emplacando sucessos como Attack on Titan e Jujutsu Kaisen, além de estabelecer novas estéticas, como visto no anime Dorohedoro, que claramente influenciou a técnica de animação utilizada no tão esperado Chainsaw Man.
A semente da Madhouse
Apesar do estúdio ter sido fundado em junho de 2011, a sua gênese pode ser traçada até bem antes disso. O veterano Masao Maruyama fundou a Mappa com 70 anos de idade e já tinha uma carreira de animação de mais de 40 anos. Ele foi um dos co-fundadores do lendário estúdio de animação Madhouse, trabalhando lá desde a década de 70 até decidir sair e criar o seu próprio estúdio, o Mappa.
Ele é um dos produtores mais experientes do Japão e já encontrou talentos como Satoshi Kon e Mamoru Hosoda. A sua carreira na Madhouse foi ilustre, mas à medida que a companhia cresceu e assumiu uma natureza mais corporativa, Maruyama decidiu sair e lançar o seu próprio estúdio. O seu desejo de criar um ambiente com mais liberdade criativa foi a semente do estúdio Mappa, o que é de certa forma irônico. Atualmente a Mappa tem os mesmos problemas de restrições criativas, trabalho excessivo e prazos absurdos que a Madhouse enfrentava.
Criatividade como raíz
A primeira produção do estúdio foi uma adaptação do mangá Kids on the Slope (Sakamichi no Apollon), dirigida por Shinichiro Watanabe (mais conhecido como a mente criativa por trás da série animada Cowboy Bebop). A série é centrada ao redor da música, principalmente jazz, contando com a produção musical de Yoko Kano, também compositora da famosa trilha sonora de Cowboy Bebop, Macross Plus e Ghost in the Shell. Até 2016 Murayama era a força que movia o estúdio, que rapidamente se tornou referência como um berço de artistas e diretores talentosos.
A era Otsuka
A razão para Murayama ter criado o Mappa era escapar das pressões e restrições que ele sentia na Madhouse. A questão é que desde a sua fundação a companhia foi um sucesso, o que atraiu várias produções, aumentando a carga de trabalho e forçando o crescimento da empresa. Maruayma percebeu que acabou na mesma situação que o tinha levado a deixar a Madhouse. A Mappa era uma vítima do seu próprio sucesso.
Logo, em 2016 Murayama decidiu sair da posição de CEO da Mappa. Nesse momento ele tinha 75 anos e o desejo por uma mudança de ritmo é totalmente compreensível. Ele criou uma nova empresa, o Estúdio M2 e decidiu entregar o controle da Mappa nas mãos do jovem talento de Manabu Otsuka. Foi sob a gestão de Otsuka que a Mappa encontrou sucesso em múltiplas produções.
A primeira a ter um grande sucesso internacional foi a aclamada série Yuri!!! on Ice que ganhou diversos prêmios e deu um grande impulso no crescimento do estúdio. O anime ganhou uma legião de fãs por retratar temas como relacionamentos LGBTQ+ e problemas de saúde mental.
Os Hits não param
Em 2016 lançou o longa metragem Neste Canto do Mundo, considerada uma das animações que melhor retratam a época da Segunda Guerra Mundial no Japão.
A partir de 2016 o estúdio emplacou uma série de animações populares, mas um de seus lançamentos mais polêmicos em termos de técnica foi Dorohedoro. A junção de animação 2D e 3D rendeu críticas tanto positivas como negativas. Após o impacto inicial foi impossível deixar de reconhecer que a animação da história de Caiman, o protagonista que tenta encontrar o feiticeiro que transformou sua cabeça humana na de um réptil, é uma obra prima por si só.
Além disso, o estúdio também lançou o talentoso diretor Sunghoo Park, que hoje é uma das referência em animações de ação. The God of High School e Jujutsu Kaisen são alguns dos animes que ele dirigiu.
Em 2020 a Mappa assumiu a temporada final de Attack on Titan. O sucesso foi tão grande que a expectativa para o fechamento da série em 2023 é palpável.
Atualmente, a série mais esperada pelos fãs era Chainsaw Man, que conta com uma animação que bebe na fonte de Dorohedoro e consegue ampliar a quantidade de sangue e violência (afinal a série é sobre um garoto meio demônio que tem braços e cabeça de serra elétrica) e se apoia em personagens muito bem construídos.
Novos lançamentos – Mesmos problemas
Apesar de produzir diversos sucessos, o estúdio é constantemente criticado pelas condições de trabalho de animadores, diretores e produtores. São vários relatos de jornadas de trabalho muito longas, prazos muito curtos e expectativas extremamente altas. Além disso, o estúdio é muito criticado pelos valores baixos que paga aos seus artistas, o que o seu diretor Manabu Otsuka reconhece, mas acredita ser um problema da indústria de animes no geral e não um problema isolado da Mappa.
Contudo, as palavras de Otsuka não apagam o fato de que a empresa se desviou da ideia original de Murayama. O foco tem sido mais atender a demanda excessiva dos comitês de produção do que cuidar dos seus artistas tão talentosos. Nesse artigo da Sakuga Brasil, o próprio diretor Sunghoo Park relata ter tido uma rotina absurda no anime God of High School, trabalhando como sub-designer de personagens, storyboard, diretor de episódio, diretor de animação e key-animator em diversos episódios, enquanto supervisionava todo o projeto.
Entretanto, o estúdio ainda consegue atrair vários artistas talentosos, mas muitos ficam descontentes com as condições de trabalho. O estúdio tem realizado cada vez mais recrutamentos e perdido vários animadores e diretores.
Apesar das críticas, o estúdio parece tentar resolver alguns dos problemas enquanto navega pela opressiva indústria da animação japonesa. Só nos resta esperar que isso não prejudique de forma excessiva os talentosos artistas da casa e que o estúdio continue a produzir animes que tantas pessoas amam e admiram.
Boa semana a todos!
Fontes: Vectornator | Sakuga Brasil.