Auto-Foco: Sean Pecknold

 


O trabalho de Sean Pecknold tem uma mágica artesanal retrô que lembra o ateliê de um Geppetto. O seu trabalho atravessa barreiras, experimentando diferentes mídias e técnicas, através do stop motion.  Seja produzindo comerciais para grandes marcas, ou criando clipes super expressivos para bandas, Pecknold deixa um impacto bastante particular por trás das lentes.

Talvez você já tenha visto o seu trabalho sem se dar conta. Sean já dirigiu e animou vários comerciais para Ikea, Sony, BBC Knowledge, entre outras empresas, e também video clipes para bandas como Beach House, Grizzly Bear, e Fleet Foxes (de que seu irmão é vocalista).  Por exemplo o lindíssimo clipe para a música “The Shrine/ An Argument”, que lhe rendeu muitos prêmios.

Ele está agora envolvido com uma série de curtas animados patrocinados pela empresa de tecnologia VSCO, e em parceria com outros artistas, chamada The Unknown. Também divide um estúdio em Los Angeles com a namorada, e famosa set designer e diretora de arte Adi Goodrich, chamado Sing Sing, além de diversos colaboradores.

Quando criança, Sean foi influenciado por ilustradores infantis como Maurice Sendak, Richard Scarry, Dr. Seuss, histórias fantásticas como Nárnia, e animações do Sesame Street e de Will Vinton. Seu pai também era Title-Designer e dirigia video-clipes, o que contou bastante para o seu contato desde cedo com cinema, tv, fotografia e animação.

Mas seu interesse por animação como algo profissional só foi acontecer bem mais tarde. Durante uma viagem de 2 meses pela Europa, em que seus olhos se abriram mais. Na viagem ele comprou uma revista sobre cinema e design chamada RES, que também vinha acompanhada de um DVD com curtas e videoclipes. Durante as longas viagens de trem ele lia essa revista e imaginava como poderia fazer aquele tipo de trabalho. Ver novas paisagens e conhecer novos países também encheram sua cabeça de inspiração, e ao retornar para os Estados Unidos ele estava decidido a tentar algo na área de cinema e videoclipes. Uma série de DVD chamada The Director’s Label, com trabalhos de Michel Gondry, Chris Cunningham, Mark Romanek, etc também se tornou uma das suas maiores fontes de inspiração: “Me lembro de assistir esse DVD várias e várias vezes, e pensar ‘Eu quero fazer isso.”

O stop motion veio com uma câmera digital, e a liberdade em filmar e experimentar eternamente.

“Eu não tive um treinamento como animador (infelizmente isso fica evidente, as vezes), e quando eu comecei a experimentar com isso, me apaixonei com o controle que você pode ter e a habilidade para iluminar e manipular as coisas na frente da câmera. É muito viciante quando você começa. E eu acho que meu design geralmente bebe de um senso de nostalgia talvez, na minha tendência as cores ricas e ao design limpo dos anos 60/70, apesar de eu tentar deixar com que cada peça tenha seu próprio mundo, sem dever muito a nenhuma era ou estilo.

Eu amo stop motion por poder tocar objetos e mover luzes reais. Cheguei a experimentar animação no computador antes de começar com stop-motion, mas a experiência física é tão mais real e tátil que clicar um mouse o tempo todo… Eu gosto de controlar cada pequeno detalhe em um frame e isso é mais fácil de ser feito numa escala menor, pra mim, no momento.”

“(…) o Stop-Motion tem uma qualidade infantil, não importa o que você fizer, o estilo ou a história. Mas acho que a técnica é muitas vezes vista como algo infantil demais. É uma técnica que permite uma quantidade enorme de criatividade e estilos. Eu cresci assistindo stop-motion, e acho que muito do que eu assistia se transportou para o meu próprio trabalho. Eu fico realmente surpreso que mais crianças não se tornem animadoras. É como se você passasse anos brincando com seus brinquedos e movendo personagens, e só o que falta nessa equação é a câmera. E isso é tudo o que o stop-motion é, na sua essência, brincar com bonecos e trazer criaturas a vida. É mais difícil por que você tem que diminuir o tempo quase que num momento estático, mas ainda é tão gratificante quanto quando você vê aquilo se mover em tempo real.

O Stop-Motion oferece qualquer coisa que você quiser para um público adulto. Por exemplo, o Fantástico Sr. Raposo foi um uso incrível de Stop-Motion interessante para o público adulto tanto, se não mais, que o infantil. Quer dizer, animação em geral é geralmente mal interpretada como só para crianças, mas isso é simplesmente errado. Robot Chicken, Os Simpsons, South Park, Miyazaki, Pixar e Aardman … todos são tão admirados e relevantes para a audiência adulta como qualquer outro tipo de filme.

Se você tem uma boa história que interessa as pessoas, elas vão assisti-la não importa como as coisas ou as pessoas se movam.”

Sean tenta sempre viajar e explorar o mundo o máximo possível: “Apesar de muito do trabalho que faço ser animado, o que significa muito tempo dentro de um quartinho escuro, a maioria das minhas idéias para projetos acontecem na estrada. Sempre tem algum lugar novo que eu quero ir. É estranho pra mim como nós nos tornamos sedentários nas nossas vidas quando eu acho que movimento é o que realmente faz as pessoas se sentirem renovadas e energizadas. (…) Quando você senta por muito tempo com as mãos desocupadas e a cabeça pensando em si mesmo e nos seus problemas, é aí que as coisas começam a ficar chatas e depressivas.”

Segundo ele, manter um equilíbrio entre projetos pessoais e comerciais é complicado como freelancer no mundo criativo, por que você pode gastar muito tempo trabalhando em projetos que vão embora, e isso pode acabar sugando a energia que você precisa para projetos pessoais.

“Existe um equilíbrio, porque projetos pessoais alimentam projetos profissionais e vice e versa. (…) Eu não acho que pessoas que começam a ficar ocupadas profissionalmente como fotógrafos ou diretores devem ficar um ano se passar sem fazer grandes projetos pessoais (…) Quanto mais trabalhos pessoais você fizer, mais controle você terá sobre o mundo, as idéias neles são suas, e é isso que vai durar, se tudo der certo”.

Sean explica um pouco como é seu processo de animação:

“É difícil explicar pois ele pode variar de  acordo com o projeto. Mas geralmente eu penso em idéias por algumas semanas ou dias. Depois eu vejo imagens de referência ou um pouco de filmes antigos e decido o estilo de animação que eu quero tentar. Eu tenho milhares de pastas com imagens que guardo pra referência, e alguns sites que costumo visitar como butdoesitfloat e o 50watts Eu não sou um super ilustrador, mas eu mantenho um diário com idéias e rascunhos e coisas aleatórias dos meus sonhos. 


Em seguida eu faço vários testes na câmera para decidir a iluminação e a ambiência dos cenários. Durante esse período de teste eu escrevo um script bem primário pra animação, o suficiente para apresentar e começar, porque eu sei que isso vai mudar no meio do caminho.

Eu geralmente faço um animatic da animação inteira no After Effects primeiro, com algumas formas geométricas ou personagens bem básicos, para trabalhar nos timings das cenas. Mas eu sempre deixo espaço para flexibilidade na ação, porque não importa o quanto eu faça um blocking da cena, eu geralmente descubro um jeito diferente de fazer alguma coisa enquanto estou animando.”

“Em algumas animações mais curtas, como os projetos que fiz para a BBC, os animatics eram bem mais detalhados e poderiam até ter passado como versão final pra alguém. Eu levava aquilo para o Dragonframe, o programa de animação, e usava aquilo para referência de timing para acertar os pontos coretos na narração.”

“Se estou ouvindo uma música para ter idéias, eu geralmente ponho ela pra repetir por alguns dias e olho várias imagens diferentes ou idéias, e então fico um tempo sem olhar pra elas, e depois volto, e se alguma dessas imagens ainda estiverem na minha cabeça, aí eu começo a experimentar com elas e tento construir um conceito em volta delas. Eu tendo a ter idéias quando estou caminhando ou andando de bicicleta, muito raramente tenho idéias só olhando pra tela de um computador ou imagens da internet. Mas é sempre diferente. As vezes uma idéia vai simplesmente vir do desejo de experimentar com algum material, ou método ou personagem.”

“Então eu monto minha cena na minha mesa multiplano ou numa mesa ajustável, coloco os personagens, e uso minha Canon 5d conectada a um laptop com o Dragonframe. Eu gasto bastante tempo iluminando, as vezes gasto um dia inteiro com isso. Tomo muito cuidado com a iluminação de cada cena para ter certeza de que a ambiência esteja certo para a cena e a história. Aí eu animo, e com sorte, se eu fiz tudo certo, o corte fica ok e não precisa de muito mais a ser feito na pós-produção. Mas depois disso eu ainda pego as imagens em RAW e colorizo elas no Lightroom, e finalmente re-exporto elas em Quicktime para editar as cenas com a trilha sonora.”

Sean costuma usar uma mistura de animação multi-plano com técnicas de massinha:

“Eu sempre escolho o material com base no visual. Eu amo trabalhar com massa de modelar e amo trabalhar com papel. Papel funciona muito bem no multi-plano, e eu tenho tentado encontrar jeitos de integrar outros materiais no multi-plano também. Massa é ótima no jeito que ela reflete a luz e é tridimensional, mas eu descobri meios de fazer o papel também parecer tridimensional, usando tinta e a posição das luzes para simular profundidade. É sempre um desafio divertido tentar pegar elementos individuais e faze-los pertencer ao mesmo universo.”

“A maioria das minhas animações mais recentes foram feitas todas na câmera. Mas eu sempre uso After Effects quando necessário, e alguns elementos simplesmente não fazem sentido serem feito na camera (…)Tecnicamente tudo é feito a mão mas nem sempre completamente na câmera. Mas se eu tivesse tempo, acho que tudo seria filmado direto na câmera.”

“Eu sinto que ainda estou aprendendo. Eu nunca estudei animação, e sinto que aprendo em cada projeto, tento estudar mais cuidadosamente o jeito que as coisas se movem em tempo real. Mas ainda não me sinto muito como um animador profissional, mais como um artista que tenta visualizar idéias usando qualquer coisa a minha disposição. Quando você olha pra estúdios como Laika e Aarman, eles botaram o nível lá em cima como estúdios profissionais. Eu jamais poderia competir com esse nível de técnica, e não tento. Minhas coisas sempre foram um experimento com estilo e técnica, e eu geralmente continuo tentando novas coisas também, pra tentar ser mestre em qualquer aspecto de animação. Pau-pra-toda-obra talvez me defina por enquanto, mas estou ok em fazer as coisas de um jeito diferente por enquanto.”

“Gostei bastante de ter mergulhado mais em trabalhos live-action nos últimos dois anos. É uma diferença grande, ficar meses trabalhando sozinho numa caverna, pra depois trabalhar com muitas pessoas num tempo muito menor que o do stop-motion. Mas acho que mesmo se meu estilo ou técnicas mudam de projeto pra projeto, a linguagem visual, a ambiência, o sentimento e as idéias são consistentes e estão evoluindo.”

Fontes:
Sean Pecknold,  The Unknown, VSCO, Bomb Magazine, One Point Four

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