Exploração no mercado de Motion

Há alguns meses publiquei um texto aqui no blog intitulado “Manual de Exploração do Iniciante“, onde listei de forma sarcástica um manual com inúmeras situações de exploração que acontecem todos os dias no nosso mercado de Motion e indústria criativa no geral, muitas delas que eu mesma vivenciei. Uma cartilha completa que parece ser usada à risca por muitas empresas na hora de contratar um animador e que muitos tentam, de forma absurda, normalizar.

Mas hoje, decidi falar um pouco mais sobre o assunto de forma direta, pois acredito que a exploração profissional que ocorre nessa indústria pode e deve ser combatida, e esse combate começa a acontecer primeiramente quando falamos sobre isso e reconhecemos que existe de forma escrachada.

Então, se você costuma frequentemente fazer horas extras sem receber por isso, é convidado a “eventualmente” trabalhar nos finais de semana ou exerce funções que não estavam no combinado, no título do seu cargo e seu salário não condiz com tudo o que você entrega… Sim, você está sendo explorado.

Existem várias coisas que deveriam ser ditas às pessoas que estão ingressando na carreira de Motion Design, daquelas do tipo “o que você falaria pra você mesmo se pudesse voltar no tempo?” e com certeza dizer que não existe glamour algum nesse mercado seria uma das coisas que estaria no topo da lista, porque afinal não existe mesmo. E com isso eu não quero dizer que seja uma profissão ruim ou desencorajar quem quer que seja, mas apenas alertar que essas situações exploratórias estão aí fora adoecendo pessoas, levando artistas incríveis à exaustão mental, física e ao esgotamento profissional pelo Burnout.

Sei que quando estamos começando na carreira, buscando dar o primeiro pulo de entrada no mercado como motion designers, tudo o que queremos realmente é uma oportunidade de estar dentro, de sentir que o start foi dado mas fica ligado! Você é o alvo principal que a galera que explora vai tentar usar e abusar. É aí que a falta de experiência, de aviso e a falta desse assunto ser mais falado aos 4 ventos nos faz achar que faz parte a gente acumular função recebendo pouco, ficar todo dia depois do horário e dar conta de pauta bomba que chegou no fim do dia pra ser entregue ainda hoje; e digo isso porque passei por essas situações várias vezes trabalhando fixa, ficando estressada e vendo pessoas ao meu redor desabando no psicológico sem fazer nada pra roda girar, apenas se conformando com aquilo.

No fim das contas, não existe um lugar perfeito pra se trabalhar, nem no estúdio de animação dos sonhos porque acredite, lá também tem prazo apertado, gente virando noite e pipeline bagunçada, mas a gente meio que esquece disso vendo os projetos insanos e incríveis que eles publicam nos portfólios. Então não ache que, quando você trabalhar na função que é seu objetivo de carreira ou num lugar que você admira e parece grande, as coisas serão menos bagunçadas e conturbadas.

A exploração pode ser muito sutil, na maioria das vezes a gente é explorado e nem se dá conta de tanto que a coisa é normalizada. Somos explorados desde um teste pra vaga de motion que não é remunerado até por nós mesmos quando tentamos auto sabotar o nosso valor cobrando pouco por um freela, aceitando cliente ruim, sem levar em conta todo o custo que temos para realizá-lo e dessa forma acabamos pagando para trabalhar. Todos essas coisas pouco a pouco vão causando frustração com a área e há quem desista de trabalhar com animação por isso.

Temos que ter isso bem claro, não nos permitir sermos explorados, pois deixar isso acontecer conosco e nos destruir também é uma forma de compactuar com essa cultura de exploração. E quanto mais cedo termos isso claro, de que a indústria criativa está longe de ser glamorosa, mais rápido vamos nos blindar e saber dizer não, reconhecer quando uma agência, uma produtora ou um freela não está nos valorizando e que é hora de movimentar a energia, buscar outras oportunidades.

Ilustrações de capa e corpo do texto por Louise Bonne@bonne_art

Um pouco mais sobre a artista
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Louise é animadora 2D, ilustradora e designer de produto. Atualmente trabalha no Copa Studio (Rio de Janeiro – RJ) onde participou de séries como Irmão do Jorel (Cartoon Network), Gigablaster (gloob) e Johnny Test (Netflix). Eventualmente realiza freelas de ilustração e cel animation.

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