Papo Lemonade | Brasileiros no Canadá: Robson Ribeiro

Com um crescimento cada vez maior da indústria do cinema, animação, e games em cidades como Vancouver, Montreal e Toronto,  o Canadá tem sido um dos principais países de imigração para designers, animadores, vfx e concept artists do mundo todo (muitos deles brasileiros) nos últimos anos.

Boa parte desse crescimento foi impulsionada pela mudança ou expansão de muitas empresas tradicionalmente alocadas na Califórnia. Por ser também um país conhecido por ser bastante amigável, comparado com outros a países, aos imigrantes, o Canadá é um lugar dos sonhos para muitos: maior oportunidades de emprego na área criativa, uma cultura aparentemente aberta a estrangeiros, e condições de vida mais estáveis e baratas.

O Layer Lemonade quis saber, então, com alguns brasileiros que já estão lá há alguns anos o quanto dessa imagem é mais mito que realidade, e como tem sido a experiência desses brasileiros ao mudar de casa e cultura.

Nosso primeiro papo foi com o Robson Ribeiro, animador e generalista 3d trabalhando a cerca de 2 anos no Canadá.

 

LL – Primeiramente, conte pra gente, como você decidiu que iria seguir carreira na animação 3d? E como você aprendeu: escolas, cursos online, estágios, freelas, estudando sozinho?

Robson – Vou tentar fazer a história longa ser curta (rs). Sempre gostei de desenhar (história padrão da galera de CG), muito influenciado pelos animes da falecida TV Manchete. Lembro que na época dos CGIs dos jogos de Play Station 1 sempre me chamavam a atenção, mas durante esse tempo eu achava que isso era feito na NASA.

Bem, anos se passaram e na época dos famigerados vestibulares eu não fazia idéia do que fazer e decidi por Ciência da Computação (nem preciso dizer que deu errado né?! Durei 1 período e meio, Rs).  Bem no ano seguinte resolvi ir para Arquitetura ou Desenho Industrial, passei em ambos e acabei indo para UFRJ pois era mais próxima de casa. O caso que também não me identifiquei com o curso por completo, e numa tarde passeando pelos corredores, vi um banner falando de um curso de 3Ds Max de 40 hrs numa escola no centro. Gostei da idéia e resolvi ver qual era; Adorei o curso. De lá pesquisei se haviam cursos de faculdade com esse foco, então achei um na Veiga de Almeida, também no Rio de Janeiro. Fui levando as duas faculdades e fazendo estágio enquanto pude, comecei como estagiário na área de maquete eletrônica (depois efetivado, fiquei nessa área por quase 4 anos) onde podia juntar os conhecimentos de ambos os cursos.

Com o tempo fui percebendo que gostava muito mais de CG/ animação do que projetos de arquitetura, e eventualmente resolvi trancar a faculdade. O ponto decisivo da escolha por 3D foi uma visita ao estúdio da finada Seagulls Fly (um dos maiores studios já criados no Brasil), onde tive o prazer inenarravél de conhecer o estúdio, alguns artistas, e ver um pouco da magia dos trabalhos fantásticos feitos lá. Além de poder ter trocado uma idéia com o Fernando Reule (até hoje eu agradeço por esse dia). Daí em diante eu tive a certeza que era isso de carreira que seguiria.

LL – Quais são suas maiores influências artísticas e profissionais, aquelas pessoas ou projetos que te inspiraram a não desanimar e seguir em frente?

Robson – Como animador, eu diria tudo que é produzido pela Disney, desde os clássicos aos filmes de CG mais recentes. Trabalhos de CGI da Blizzard, em específico os curtas que eles lançam pros jogos, PIXAR (como não né), Dreamworks e por aí vai, minhas influências são bem clichès rs. Na verdade, influências vem de muitas fontes, as vezes zapeando pelo Artstation a quantidade de trabalhos excelentes é gigante, cada um transmite uma pequena idéia que dali eu penso num projeto que isso poderia ser aplicado. Adoro tb curtas, vejo muitos no Vimeo e no Youtube que são surreais.

Profissionais, eu gosto muito dos animadores Alan Camillo e Bruno Monteiro (professor na OnFire), pessoas e profissionais extraordinários. Os professores do iAnimate que tive a oportunidade de fazer dois workshops por lá, são surreais, além de animadores AAA, são professores excelentes, em destaque ao Jason Ryan, criador e cabeça do curso. Outros artistas 3D como o Fernando Reule (ILM) citado acima, Paul H. Paulino (Scanline) que tem feito um trabalho pela comunidade CG muito bacana com artigos e entrevistando até outros artista para falar um pouco da nossa área, Victor Hugo Queiroz e Gus Soares que tem um trampo com personagens animal; Isso para citar alguns. Para encerrar os Nine Old Man que graças a eles muito dos conhecimentos que hoje é quase regra em animação, foi desenvolvido anos atrás.

LL – Como você foi parar no Canadá? Aonde trabalha no momento?

Robson – Vim para o Canadá para fazer um curso de pós graduação de 1 ano, por consequência um visto de trabalho após o curso, visto que foi renovado por mais alguns anos e agora estou no aguardo da residência permanente que foi aprovada alguns dias atrás ( ! ). Hoje trabalho na Tangent Animation em Winnipeg.

LL – Como foi o processo para conseguir o visto de permanência? Quanto tempo demorou?

Robson –  Meu processo foi estudar, tirar o visto de trabalho após a graduação que se chama Post Graduation Work Permit. Durante esse tempo eu preenchi os requisitos para residência permanente, apliquei em Setembro de 2016, o processo rola algumas etapas como envio de documentos, exames médicos e pagamentos de taxas (uma facada!) e agora em janeiro de 2017 fui aprovado. O processo que fiz foi através do Express Entry (assim que completei um ano de trabalho no Canadá) caso alguém queira pesquisar sobre.

LL – Comparando o mercado no Brasil e no Canadá, quais são as maiores diferenças que você percebeu:

  • na relação dos clientes com os estúdios/profissionais : Minha relação foi só com estúdios, trabalhei em dois. A relação profissional aqui é bem mais sólida, preto no branco. O gringo no geral costuma ser mais direto ao ponto.
  • nos tipos de projetos e nos prazos: Como trabalho com feature film os prazos costumam ser bem bacanas, afinal são 4578906 versões, revisões e afins, e projetos assim, levam em média 2 anos. A relação com os production managers são bem legais, caso uma coisa tenha sido designada para um prazo X e você conversa e explica que aquilo não é possível ser feito naquele tempo, geralmente o tempo tende a ser reajustado, como falei a relação costuma ser mais direta. Quem trabalhou com mercado imobiliário no Rio migrar para essa área as vezes nem entende (rs). Agora nem tudo são flores, quando entramos nos últimos 15-20% do trabalho (crunch time) aí as coisas apertam um pouco. O mercado de VFX ainda enfrenta muitos problemas de prazos apertados e problemas que ouvimos e vemos por aí, mesmo aqui. Mas não posso dizer muito pois não trampei nesses tipos de projeto ainda.
  • nas relações trabalhistas e na remuneração : Remuneração eu acho bem justa, consegue-se bons salários sim. Dica: pesquisem no Glassdoor ou pela ferramente salary do Linkedin exatamente os números de acordo com os estúdios ou a especialização (animador, modelador, etc etc).  Na relação trabalhista: como nossa profissão não é sindicalizada muito do contrato vai da negociação entre empregado e empregador, mas leis trabalhistas são mais simples, e pelo menos nos locais que trabalhei, as leis foram respeitadas.
  • no comportamento dos colegas de trabalho com relação a questão trabalho x vida pessoal ? A relação com os colegas de trabalho é bem bacana, se você trabalha duro e trata bem seus colegas, as relações fluem naturalmente. Talvez o canadense não seja tão fanfarrão quanto nós brasileiros, mas uma vez que você quebra aquele gelo inicial são pessoas adoravéis e educadas. A relação de trabalho x vida pessoal está bem balanceada, trabalho 80% -85% do meu ano fazendo meu schedule normal de 40 horas semanais, nem mais nem menos, e durante o crunch time sobe um pouco como 50 a 60 horas, mas recebemos pelas horas extras.

LL –  E o que não muda ?

Robson – Existem empresas e profissionais ruins de se trabalhar em toda parte do mundo (estou tentando ser político nas palavras, rs). Até mesmo aqui você ouve casos de artistas tendo que trabalhar horas extras sem pagamentos, vide o caso da Nitrogen, estúdio que fez o filme Sausage Party, procurem no Cartoon Brew o artigo completo. Algumas empresas de VFX que coagem os artistas a ficarem horas extremas, isso é conhecido no mundo inteiro. Então muito cuidado ao aplicar para um trabalho, pesquise sobre, se possível entre em contato com artistas daquele lugar e tentem saber como é o ambiente de trabalho (mas não seja um chato rs).

LL – O que você mais gosta da vida no Canadá? O que sente falta do Brasil?

Robson – Tranquilidade, segurança, e, profissionalmente falando, ter a possibilidade de trabalhar em projetos que no Brasil seria quase impossível. Faz falta a falta séria de amigos de infância e família.

LL – Quais você diria que são as maiores ilusões das pessoas aqui quando falam sobre ir trabalhar e morar fora do Brasil?

Robson – Achar que será um mar de rosas, que tudo é muito fácil. Trabalhar em uma outra língua, costumes diferentes, estar longe de amigos de infância e família pesa e você tem que ter muita certeza do que vem buscar aqui e se manter focado para não querer voltar. No meu caso foi tranquilo, porém minha esposa sofreu muito mais na adaptação. Falando sobre clima por exemplo, na cidade onde moro no topo do inverno eu já peguei -50 graus (sim é mais frio que Marte!). Datas como aniversários, datas festivas como natal, casamentos e reuniões com amigos são duras em não poder participar, só quem está aqui sabe.

No meu caso foram coisas bem ok, sempre tem um dia ou outro que bate uma leve recaída, mas logo passa. Eu vim para cá com tanta gana com meus sonhos que isso acaba sendo o combustível que me move.

LL –  Qual o melhor conselho que recebeu de alguém na sua área que gostaria de passar adiante para quem ainda está começando, ou que conselho você mesmo daria ?

Robson – (Vamos aos clichès. Não existe fórmula mágica. A teoria é fácil, a prática que nem sempre…) Nada vem fácil, você tem ralar MUITO, não se acomode, mesmo estando em um trabalho maravilhoso invista em trabalhos pessoais. Profissionais renomados como Glauco Longhi, Rafa Grassetti, Fausto de Martini investem o pouco tempo que tem em trabalhos pessoais para sempre serem um profissional melhor e é só checar as entrevistas desses caras.

 
Vamos às Rapidinhas!

LL – 24fps ou 30 fps?

Robson – 24.

LL – Animação realista ou cartoon?

Robson – Cartoon, mas animação bem feita pode ser feita até com palitinhos que vou gostar (rs).

LL – Mac ou Windows?

Robson – Windows.

LL – Inverno Canadense ou verão Brasileiro?

Robson – Inverno Canadense.

LL – Limonada ou chá?

Robson – Limonada beeem gelada =D.

O Layer Lemonade agradece enormemente ao nosso amigo Robson, por dividir um pouco do seu tempo conosco nesse papo.

Muitíssimo obrigada e boa sorte na nova casa!

 

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